- ver uma mesa de professor ser atirada pela janela do segundo piso na direção da quadra, que por pouco não atingiu as crianças de quarta série com as quais trabalhava. O autor da barbárie foi identificado; para variar, um daqueles adolescentes de 14 ou 15 anos que frequentam a quinta série da tarde, entre crianças de 10 e 11 (minoria que está acompanhando a série). O que a escola pôde fazer? Advertir e mais nada.
- ajudar a procurar bombas de fabricação caseira postas pela manhã nos banheiros da escola - duas explodiram, causando estragos e por pouco não ferindo ninguém. Encontraram o autor do feito, que com ele tinha ainda mais oito para "plantar" onde quisesse. O que a escola pôde fazer? Chamar os pais, advertir e mais nada.
- Surpreender em pleno horário de aulas dois adolescentes consumindo drogas no banheiro masculino - outros dois, diferentes daquele primeiro, mas também cursando série inadequada à sua idade. Aproveitando que não foi visto por eles, comunicou imediatamente a coordenação, que fez o "flagrante". O que a escola optou por fazer? Advertir e mais nada; o argumento era de que seria preciso chamar a patrulha escolar, que faria o B.O. na delegacia do adolescente e os encaminharia para casa!!! E, claro, algo assim descontentaria os traficantes que abastecem a escola, pondo todos em risco...
- Ter uma bola de futebol atirada do terceiro piso da escola contra sua cabeça enquanto lecionava na quadra. Quem o fez, não teve sequer o cuidado de se esconder depois de atirá-la, ficando na janela rindo de sua "mira" infalível. Trazida para a direção, a doce criatura dizia: "você não sabe com quem tá mexendo, professor. Eu te pego lá fora, te arrebento, você vai morrer!" Diante da ameaça, o professor reage dizendo que vai sair da escola e ir diretamente ao distrito policial registrá-la em B.O. A resposta do aluno? "Quer que eu anote aqui meu nome e endereço pra facilitar? Você não sabe quem eu sou..." Depois a coordenadora disse ao professor, em particular, quem ele era: o adolescente responsável pelo tráfico na escola no período da tarde, com "n" passagens pela delegacia do adolescente. Uma figura que agride fisicamente sua mãe toda semana, deixando-a com hematomas, e cuja transferência para o turno da noite não poderia ser feita sem a permissão daquela mãe que não contrariava o filho em nada... e o filho não quer abandonar seu horário de "negócios". Adivinha em que a coisa toda deu? Advertência e... mais nada.
- Descobrir que a vaga que ele pôde escolher foi em substituição a um outro professor licenciado há dois anos para tratamento de problemas cardíacos e nervosos adquiridos em anos de trabalho naquela escola e em outras escolas problemáticas da rede... e que este mesmo professor já substituíra outro, também cardíaco.
- Ver a professora também recém-concursada para lecionar Filosofia chegar à sala dos professores na sexta-feira da primeira semana de aulas (!) informando que acabara de pedir exoneração do cargo, porque suportar o que teve que suportar naquela semana, com turmas do turno diurno (historicamente menos problemáticas ainda do que as do noturno!) para ganhar R$600,00 por mês não era nem razoável. Nem o dobro disso seria razoável.
Pois é... todos nós sabemos as principais consequências daquela aberração chamada Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA - veja como a sigla já diz muito!) para o trabalho na Educação. E, dentro da Educação, especialmente no âmbito daquelas escolas públicas que não conseguem - e nem podem, e nem querem! - ter mecanismos ao menos razoáveis de manutenção da civilidade mínima em suas atividades.
Os alunos fazem o que querem, quando querem, e somente aqueles cujos pais ainda carregam consigo um mínimo de autoridade e dignidade próprias conseguem ter lições de verdadeira cidadania além de conteúdos escolares.
A escola não é a família! À escola não pode caber qualquer papel fundamental da família, como preparar os rebentos para a convivência social mínima. A paz social só é possível pela sinergia de governo, escola e família, cada um com seu papel. Se o governo não faz o seu (aliás, faz ECA!) e as famílias dos delinquentes estão impotentes diante dos "monstros" que ajudaram a criar, que não se espere do professor o poder divino de redenção do indivíduo.
O discurso vazio e mentiroso da escola como instituição todo-poderosa de reversão dos quadros sociais - e como ainda tem muita gente, inocente ou mal-intencionada, repetindo esse jargão - já deu o que tinha que dar. O estado tem que dar condições materiais, de segurança e morais para o trabalho educacional; a família tem que ser chamada à participação na escola e responsabilizada direta e, se preciso, severamente pelas atitudes malogradas de seus filhos; a escola precisa ser um espaço aberto à comunidade e gerida em parceria com ela no sentido de sua melhor manutenção e para se tornar efetivamente um lugar de mudança social.
Do jeito que está, como um lugar em que as depredações e pichações são vistas (e estudadas!!!) como "manifestações culturais válidas"; um lugar em que o aluno só tem a obrigação de não faltar, pois reprovar não vai; um depósito em que muitas famílias se livram temporariamente de seus maiores pesadelos; um lugar gerido por profissionais de mãos atadas e inseguros para garantir o ambiente mínimo para seu trabalho ser frutífero, não dá...
Mas enquanto o discurso oficial for o mesmo, de que tudo está bem - precisando melhorar, mas bem! -, e de que a competência pedagógica e administrativa de quem está ligado à escola é suficiente para promover educação pública, gratuita e de qualidade, então não há mesmo o que fazer.
Aliás, há: unificar o concurso para o magistério com o concurso para seleção de agentes carcerários. Afinal, ambas as funções, em muitas escolas, apresentam mais semelhanças do que diferenças.
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